O tempo virou de repente. O arco-íris já mudou de cor, e uma rosa nunca mais desabrochou. Partiu a voz que fazia festa no coração, partiu a artista que nos ensinou a cantar mesmo com gosto de sabão na boca. Mas partiu mesmo?
O sertão ainda guarda seu rastro. Entre a cantiga de roça e a canção que embala a criança na rede, há um fio invisível que costura o tempo, um fio de inspiração que o rio não deixa secar. Ainda escuto sua melodia no vento que corre entre os galhos, no azul do céu que não se apaga. “Voa, voa, azulão”, ela dizia, e hoje, como um pássaro livre, voou.
Margarida, as feridas da vida são fundas, mas a música sempre foi remédio. E agora, nesse silêncio de saudade, é impossível não sentir o vazio do palco sem sua presença, o mundo sem sua voz. O começo do fim ou o fim do começo? Quem pode saber? A gasolina sobe, o tempo corre, e seguimos na estrada, tentando encontrar um meio de vida, um novo refrão, uma maneira de seguir sem esquecer.
Mas não há fim para quem se faz canto. Ela não se vai, ela se espalha. Fica na memória de quem a ouviu, no compasso de quem ainda dança, na esperança de quem ainda acredita. Está na cidade garantida e proibida, no sertão e no asfalto, na lágrima e no riso.
A vida, essa viagem que nunca explicamos direito, agora a leva para um lugar onde o tempo é só música e o vento é só melodia.
Voa, voa, azulão.
O céu, hoje, canta contigo.
Palmarí H. de Lucena