Nos anos efervescentes de 1960, enquanto o Brasil fervilhava com transformações culturais e musicais, emergia Sérgio Mendes, um dos maiores expoentes de uma fusão sonora que encantaria o mundo. Ao lado de sua banda Brasil ’66, Mendes trouxe ao público internacional uma combinação irresistível de samba, bossa nova, jazz e pop, criando uma sonoridade inovadora que reverberou por gerações. Conheci Sérgio Mendes nesse auge, em Sausalito, Califórnia, na companhia de Sivuca. Passamos um dia memorável em sua presença, saboreando uma feijoada preparada por sua mãe. A simplicidade e o calor humano de Mendes eram evidentes, assim como sua paixão pela música que, na época, já ecoava por todo o planeta com o sucesso estrondoso de “Mas Que Nada.”
A carreira de Mendes e sua banda atingiu patamares internacionais com essa reinterpretação da obra de Jorge Ben Jor. Embora a composição fosse simples em sua estrutura, a visão criativa de Mendes a elevou a novos horizontes. A voz suave de Lani Hall se misturava ao ritmo contagiante das percussões, enquanto o piano jazzístico de Mendes criava uma base envolvente que capturava a essência do Brasil. “Mas Que Nada” tornou-se um dos maiores embaixadores da música brasileira no exterior, seu balanço inconfundível ainda hoje simbolizando a alegria e a leveza características da nossa cultura.
Ao longo daquela década, nossos caminhos se cruzaram em várias ocasiões, sempre marcados pelo entusiasmo contagiante de Mendes com a repercussão de suas músicas. A música não era apenas um trabalho, mas uma extensão de sua própria identidade, uma conexão profunda com suas raízes. Além de “Mas Que Nada,” sua capacidade de transformar clássicos como “The Look of Love” e “Fool on the Hill” em obras carregadas de brasilidade mostrava um artista em pleno domínio de sua arte, adaptando canções ocidentais ao toque delicado do samba e da bossa nova.
A longevidade de Sérgio Mendes foi reforçada em 2006, quando ele revitalizou “Mas Que Nada” em uma colaboração moderna com The Black Eyed Peas. Essa nova versão, que incorporava elementos de hip-hop à original, provou que Mendes tinha a capacidade única de atravessar gerações e estilos, mantendo sua música relevante e vibrante em qualquer contexto. Mais do que uma simples fusão de gêneros, essa colaboração demonstrou o alcance universal da música brasileira e a visão atemporal de Mendes como artista.
No entanto, a trajetória de Sérgio Mendes não apenas moldou a música brasileira, mas a levou ao centro do palco global, criando uma ponte que ligava culturas e continentes. Ao longo de décadas, ele se reinventou e inspirou músicos ao redor do mundo, sendo sempre um embaixador da riqueza e diversidade cultural do Brasil. Em 6 de setembro de 2024, em Los Angeles, Califórnia, Mendes nos deixou, mas o eco de sua música e seu legado permanecem vivos. Suas composições atravessam o tempo, eternizando seu nome como um dos maiores responsáveis pela difusão da música brasileira e por sua fusão com o cenário global.
Sérgio Mendes & Brasil ’66 não foi apenas um grupo; foi uma revolução, uma celebração da alma brasileira que atravessou o oceano e deixou uma marca indelével no mundo. “Mas Que Nada” continua sendo um hino atemporal, ressoando como testemunho de sua genialidade e da capacidade transformadora da música em unir pessoas e culturas.
Palmari H. de Lucena