No Cine Jaguaribe, Seu Umbuzeiro
Fazia sombra no sol do verão,
Sentinela fiel, companheiro
Dos sonhos lançados na projeção.
Na calçada, o tempo se deitava
E ao som da matinê cochilava.
Na porta da escola ou do quartel,
Marchavam firmes os escoteiros.
Com Tenente Lucena, o tropel
Sonhava em ser justo e verdadeiro.
Na alvorada, a tropa se erguia
Com esperança, coragem e alegria.
O Filipeia era nossa paixão,
Seu Venelipe o mestre do jogo.
Na bola de meia, vibração,
Nos pés descalços, poeira e fogo.
Na trave torta do nosso terreiro,
Cada gol era um feito altaneiro.
No salão do Círculo Operário,
Seu Odilon erguia a esperança,
Entre discursos e calendário,
Cultivava os ideais da mudança.
E ali perto, na cadeira girando,
Seu Amaro ia rostos desenhando.
Dulce Pacote vendia ternura
Em móveis firmes, de feitio elegante.
Na vitrine, a infância mais pura
Sonhava com sala de visitante.
Cada espelho guardava um desejo,
Cada estante um futuro lampejo.
Murilo da mortuária,
Rei Matusalém do carnaval,
Radiel escrevia, na paz funerária,
Versos que davam à dor ritual.
Esses retalhos — memórias da infância —
Tecem em mim saudade e esperança.
Por Palmarí H. de Lucena