Ansiosos por escapar do casulo sanitário isolando-nos do coronavirus, revisamos periodicamente anúncios promovendo voos ou pacotes de viagem. Opções prontamente descartadas, a pandemia chegara antes aos lugares que escolhemos. Somos cidadãos de um mundo “fora da área de serviço”, prisioneiros das agruras do negacionismo. Liberdade e viagens, gêmeas siameses em busca da felicidade. Sensação de sairmos de casa para qualquer lugar, sem extrapolar as limitações da crise sanitária que nos emprisiona, uma longa estrada pavimentada de perigos e desvios desconhecidos.
Decidimos que a forma mais segura de tirar-nos do isolamento domiciliar, das grades de ferro e cercas elétricas que nos protegiam, seria transformar o carro em uma prisão móvel, armadura sanitária para uma travessia rápida e segura por pequenas cidades, estradas decoradas com quiosques de ambulantes, pessoas caminhando indolentemente nos acostamentos, pequenas aglomerações em comedores de higiene questionável. Longo trajeto de quase 2.000 quilômetros, éramos um bólido atravessando cirurgicamente a atmosfera poluída, encandeando um povo oprimido pela cegueira dos seus líderes. Observamos de soslaio, sem tentar apurar o foco ou pelo menos interagir visualmente, um mundo escancarado para o contágio, a miséria, a dolorosa solidão do internamento hospitalar e a prematura perda de entes queridos.
Semanas depois, nos debruçamos sobre o sentimento de nostalgia e o vazio que viajar não preenchera. Pensamos em pessoas que sentíamos falta, sem nunca perceber. Bons amigos com quem fazíamos coisas juntos, experimentávamos um novo restaurante ou planejávamos mais uma viagem. Vendedores, garçons ou preparadores de comida confortavelmente simples, parceiros no universo de amizades ou conhecimentos fora das fronteiras da família ou intimidade de amigos tradicionais. Eram amigos de alguma ou outra maneira, impossível de conseguir substitutos na pandemia.
Aplicativos promovem entrega em domicílio, pífia tentativa de substituir atividades que nos uniam a desconhecidos, a cozinheira que sabia como gostávamos de tapioca, o garçom conhecedor de nossas limitações gastronômicas, a vendedora que escolhia frutas na quitanda, o caixa da padaria que sempre mencionava a falta de um amigo comum que não existe mais. “A cultura só é humana na medida que seus membros se reconheçam”, parafraseando o filosofo Martin Buber. Pessoas que encontrávamos no nosso dia a dia, trocando saudações, comentários mundanos e ate preocupações. É necessário conscientizar-nos da vitalidade que estas amizades podem adicionar ao nosso bem-estar, enriquecendo vidas, ajudando no retorno à realidade, consertando teias sociais danificadas pelo isolamento e o campo de destroços herdado da pandemia.
Palmarí H. de Lucena, membro da Uniäo Brasileira de Escritores
Não sei falar bonito
Mas mergulhei nesse mundo.*!!
É um provocador de valorização das boas amizades! Estou planejando uma atividade turística para pós-pandemia, criando uma emocional rede internacional de amizade, que como meio de hospedagem poderá muito estimular um deslocamento turístico para quem gosta de viajar e fazer amigos, é o FRIENDS HOUSE…aguarde!
Parabéns meu amigo revela uma realidade que infelizmente todos nós estamos vivenciando
Viajei no resgate de antigas amizades, para nós o tempo voltou para lembrarmos momentos memoráveis. O seu texto, Palmari, é perfeito dentro desse contexto pandêmico.