Podemos imaginar o que teria acontecido se um homem negro aparecesse em um comício de Donald Trump agindo “suspeitosamente” ao redor dos detectores de metal? É evidente que a resposta seria diferente da experiência de Thomas Matthew Crooks, o atirador de 20 anos que alvejou o ex-presidente Trump.
Não é segredo para nenhum americano consciente por que Crooks, apesar de considerado “suspeito” pela polícia e pela segurança no evento de Trump em 13 de julho, em Butler, Pensilvânia, não foi detido. Ele não foi interrogado, perseguido ou vigiado de perto enquanto escalava o telhado de um prédio e apontava um rifle AR-15 a apenas 130 metros de onde Trump falava.
Uma análise rápida da história recente dos Estados Unidos revela que Crooks não foi parado e capturado antes de puxar o gatilho porque ele era branco. Mais uma vez, o “síndrome do homem branco solitário” entra em cena.
Se Crooks fosse negro, ele teria sido obrigado a mostrar identificação. Se ele se recusasse, provavelmente seria jogado ao chão e baleado até a morte ou estrangulado, como D’Vontaye Mitchell, morto por seguranças de hotel em Milwaukee, Wisconsin. Ao contrário de Trayvon Martin, de 17 anos, morto na Flórida, ou Tamir Rice, de 12 anos, baleado em Ohio enquanto segurava um brinquedo de arma, Crooks foi beneficiado pela dúvida e permitido passar despercebido.
O resultado foi trágico: Crooks atirou e feriu Donald Trump, matou o bombeiro e pai de família Cory Compechello, e feriu gravemente outras duas pessoas antes de ser abatido por um atirador de elite da polícia.
As autoridades agora investigam intensamente o que foi descrito como uma “falha épica” de segurança, principalmente do Serviço Secreto. Mas todos sabemos a verdadeira razão. A falha foi catastrófica porque Crooks era branco. O presidente Joe Biden prometeu uma investigação completa, mas os americanos já viram esse cenário antes.
Quando milhares de apoiadores predominantemente brancos de Trump marcharam em Washington, D.C. em 6 de janeiro de 2021, as agências federais não estavam preparadas com o nível adequado de força, resultando na insurreição violenta. Se os manifestantes fossem negros, a resposta das forças de segurança teria sido diferente, com preparação militar, cães e rifles de alta potência.
A tentativa de assassinato de Trump foi frustrada, mas não sem vítimas. A ironia é que Trump, que alimentou o racismo e a supremacia branca na América, quase foi morto pelo mesmo mal que ajudou a perpetuar.
Trump insinuou que os Cinco do Central Park mereciam a pena de morte, liderou o movimento birther contra Barack Obama, chamou Haiti e nações africanas de “países de merda”, e denegriu jogadores de futebol que protestavam contra a violência policial. Ele também defendeu supremacistas brancos e estereotipou “empregos para negros”.
Donald Trump sobreviveu à tentativa de assassinato, mas o incidente expôs novamente a profunda falha na segurança e a discriminação racial arraigada. O ex-presidente, até agora impenitente, quase foi vítima do mesmo ódio que cultivou.
É hora de uma introspecção séria sobre como o racismo sistêmico continua a influenciar a segurança e a justiça nos Estados Unidos e em outros países como o Brasil.
Palmarí H. de Lucena