Viajando pela Espanha, especialmente pelas áreas mais deprimidas do país, uma pessoa sente-se como se estivesse na encruzilhada de duas crises mundiais: recessão econômica e terrorismo. Conversas com acadêmicos, comentários anedóticos de pessoas comuns e a mídia, expressam diariamente a frustração, descontentamento, e perplexidade com o fato do país ainda encontrar-se em uma depressão econômica profunda.
O mal estar nacional é agravado pelo sentimento de vulnerabilidade a ataques terroristas contra cidadãos espanhóis. A recente descoberta de arsenais da ETA, a organização terrorista basca, em Portugal e na França; sequestro de cooperantes da Acción Solidária de Barcelona no Mali, por elementos associados a Al-Queida, e a morte de soldados espanhóis no Afeganistão por terroristas do movimento talibã, dramatizam a complexidade da situação da Espanha frente às incoerências do terrorismo. Membros da ETA e da GRAPO, dissidência comunista armada, matam seus compatriotas indiscriminadamente em nome da autonomia regional e de ideologias radicais. O povo espanhol sente-se vitimado pelo terrorismo, em todas as suas formas. Lamentavelmente, a comunidade internacional não conseguiu até hoje chegar a um acordo, sobre o que é terrorismo ou como combatê-lo…
Terrorismo como ato, antecede a própria palavra, originária do “Reino de Terror” dos Jacobinos na Revolução Francesa. A prática de ameaçar, ferir ou matar pessoas inocentes por razões políticas, ideológicas ou religiosas é também citada nos tempos bíblicos, quando uma seita judia, conhecida como os zelotes judeus, fizeram uma oposição sangrenta à ocupação romana, há mais de 2.000 anos. Seriam os zelotes condenados como terroristas ou louvados como combatentes da liberdade nos dias de hoje? Eis ai o grande dilema confrontado pelas Nações Unidas…
Durante as ultimas décadas, a ONU adotou mais de uma dúzia de protocolos e convenções condenando o terrorismo global. Infelizmente, nenhum consenso existe sobre como combatê-lo, ou “eliminá-lo da face da terra”, como propôs Kofi Annan, o ex-secretario geral da organização. Em 1937, a Liga das Nações, organização antecessora da ONU, definiu terrorismo como “… todo ato criminoso dirigido contra um estado, premeditado e calculado, com o intuito de criar um estado de terror na mente de pessoas específicas ou grupo de pessoas ou o público em geral”. A definição nunca foi ratificada. Subsequentemente, uma resolução da ONU, aprovada em 1999, reiterou que “… atos criminosos intencionados ou calculados em provocar um estado de terror no público em geral, grupo de pessoas ou pessoas especificas por razoes políticas são, sob qualquer circunstância, não justificáveis, independentemente de considerações políticas, filosóficas, ideológicas, étnicas, religiosas ou outra natureza, usada para justificar tais ações”. A resolução não contém uma definição precisa de “atos criminosos”. Não é muito complexo concluir que usar uma aeronave civil como uma arma de destruição massiva se enquadra na definição. Porém, nem todo ato violento pode ser facilmente classificado como tal, devido à relutância de alguns países ou grupos de classificar ações tomadas pelos chamados combatentes da liberdade, grupos separatistas ou insurgentes como atos criminosos ou terroristas.
Enfim o que é terrorismo? Como nações devem tratá-lo? As respostas variam de acordo com percepções nacionais, poderio político-militar e importância de um país na esfera mundial. Richard Baxter, um juiz da Corte Internacional de Justiça, afirmou que “… temos razão de lamentar que o conceito de ‘terrorismo’ nos foi infligido. O termo é impreciso; ambíguo. Acima de tudo, não serve nenhum propósito legal operacional…” Experts citam as palavras de outro Juiz, Potter Steward, da Suprema Corte dos Estados Unidos, que admitiu ser praticamente impossível chegar a uma definição inteligível de obscenidade, ponderando, “conheço obscenidade quando vejo uma”. O mesmo conceito é aplicado ao terrorismo. Em outras palavras, terrorismo, como obscenidade ou beleza, é definido de acordo com os olhos daquele que vê… Uma tarefa extremamente complexa, no caso da Espanha, onde compatriotas cometem atos de violência contra seus homônimos em nome de causas, que não são universalmente apoiadas pelo povo espanhol ou pela comunidade internacional…
Espanha 2010