Nos Estados Unidos, o devido processo legal sempre foi considerado uma das bases da justiça. A ideia de que toda pessoa tem o direito de ser ouvida antes de sofrer uma punição é um princípio simples, mas essencial para qualquer democracia. Nos últimos tempos, porém, esse direito vem sendo colocado em risco.
Há casos de pessoas detidas dentro do país e enviadas para prisões no exterior, sem qualquer audiência, defesa ou verificação adequada de identidade. Algumas dessas pessoas podem, de fato, representar ameaças. Mas outras são inocentes, confundidas com criminosos por causa de um nome ou até por uma tatuagem. Sem a chance de explicar quem são, ficam presas por tempo indeterminado — às vezes, para sempre.
O governo americano tem usado argumentos legais para justificar ações rápidas e discretas, alegando que não se trata de punição, mas de remoção de estrangeiros. Ainda assim, a forma como tudo tem acontecido levanta preocupações: falta transparência, falta controle independente, falta, sobretudo, um olhar humano sobre quem está do outro lado.
Recentemente, a Suprema Corte decidiu que é preciso haver um mínimo de garantia: as pessoas têm o direito de serem informadas e de poder contestar a decisão antes de serem removidas. Isso foi um passo importante. Mas a resposta do governo foi hesitante. Em vez de reconhecer a decisão, houve resistência, atrasos e até tentativas de ignorá-la.
Esse tipo de atitude cria um clima perigoso. Quando o governo começa a agir como se estivesse acima das regras, abre-se espaço para abusos. O mesmo pode acontecer em outras partes do mundo.
No Brasil, por exemplo, o devido processo legal também é uma garantia constitucional — mas, como nos Estados Unidos, sua aplicação nem sempre acompanha o ideal previsto em lei. Casos de prisões preventivas excessivamente longas, julgamentos demorados e decisões judiciais frágeis são sinais de um sistema que muitas vezes falha em garantir justiça de forma plena e igualitária. Além disso, a seletividade penal — que atinge desproporcionalmente os mais pobres — revela um desequilíbrio preocupante. Defender o devido processo aqui não é apenas assegurar direitos legais, mas reforçar o compromisso com a dignidade e a equidade.
O respeito ao processo justo é mais do que uma formalidade jurídica. Ele representa a confiança de que ninguém será punido sem ter a chance de se explicar. Quando essa confiança é quebrada, o prejuízo não é só individual — é coletivo. Enfraquece-se a democracia e mina-se a ideia de que todos somos iguais perante a lei.
A construção de um país justo começa com regras claras, respeito às decisões judiciais e compromisso com a verdade. Se esses pilares forem abalados, o que sobra é a incerteza — e a insegurança, não só para quem vem de fora, mas para todos que vivem sob essas leis.
Palmarí H. de Lucena