É uma tendência humana interpretar desastres como confirmação de crenças ou de propagar ideias esdrúxulas escondidas nos cânions do cérebro humano. Alguns justificam a construção de muros entres países, outros conceitos políticas até então considerados obnóxios ou perigosamente autoritários. Profetas da desgraça acusam o mundo de ter dado as costas à Deus. Enfim, temos uma crescente pandemia de raciocínio motivado na alta complexidade e escala de uma crise global imprevisível, perigosamente difusa, o divisor de águas entre a globalização e surtos do vírus de nacionalismo tóxico, mantido em animação suspensa desta a derrota do Eixo Nazista.
Enquanto procuramos soluções para os problemas de saúde e cuidados médico-hospitalares causados pela pandemia, a radiografia da crise mostra sistemas de saúde lapidados pela ineficácia e corrupção do poder público, fomentando desigualdades sociais e castigando comunidades oprimidas pela pobreza e ausência do governo. A grande pergunta é: voltamos ao marco zero depois que a crise terminar?
Ataques de políticos conservadores e extremistas a OMS, Centers de Diseases Controls e Prevention, ministérios da saúde e pesquisadores, são erroneamente ou deliberadamente fundamentados na prática populista de maximizar qualquer falha institucional, pequena que seja, para fomentar descredito, restringir a influência da ciência e medicina no combate a pandemia e politizar políticas públicas de saúde.
É evidente que o distanciamento social está achatando a curva de contágio e reduzindo o número de internações e casualidades. Lugares mais agressivos na implantação desta política mostram bons resultados, o que não pode ser ignorado, no entanto, é difícil imaginar como profissionais cuja orientação salvaram milhares de vidas, possam ser sujeitos ao descredito por lideres irresponsáveis ou oportunismo político. É fácil vislumbrar como acusações inadequadas, disseminadas nas mídias sociais ou palanques presidenciais, possam desestimular a adesão popular a medidas de proteção da vida e do bem-estar social. Eventualmente, políticos serão julgados pela história, os médicos pela ciência.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores