Os griôs da Caiana dos Crioulos

Os griôs da Caiana dos Crioulos

Precariamente digitalizado registro fotográfico de uma banda de pífanos, seis homens negros posando com seus instrumentos na pista do Aeroporto Castro Pinto. Completando a cena, o nostálgico pano de fundo de uma aeronave a hélice provavelmente da então imbatível Panair do Brasil. Começo de uma aventura musical que os levaria à Brasília bem longe da Comunidade Quilombola da Caiana dos Crioulos de Alagoa Grande, um dos quilombos mais autênticos do Brasil. Escapando do jugo da servidão, seus antepassados encontraram refúgio no topo de uma escarpa íngreme. Ilha de agricultura de subsistência perdida no mar verde de plantações de cana de açúcar.

“Ogriot é um mediador dentro dasociedade;ele resolve conflitos e leva à calma. Ele é músico, cantor, contador de histórias, dançarino, um organizador das cerimônias sociais que utiliza a palavra como seu principal instrumento”, palavras do griô africano Hassane Kouyaté. Preservada na memória da comunidade por mais de três gerações, a cultura dos pífanos sobreviveria mesmo com a partida dos seis homens na fotografia: Mestre Firmo Santino e seus companheiros Vital, José Capalo, Anísio, Antônio José, Heleno e José Januário. Juntos com os pífanos, o coco de roda e as cirandas formam um arcabouço imenso de uma cultura que sustenta, restaura ou ilumina os morros e as planícies verdejantes, paisagens distantes nos tempos de alhures.

Breve descrição enviada com a fotografia: “Banda de Caiana, quando se preparava pra embarcar, no aeroporto Castro Pinto, para apresentação em Brasília, levada pelo insigne Tenente Lucena”. Visitamos Caiana dos Crioulos em busca de algo, algo que unisse nossos tempos passados. Encontramos um grupo de pessoas jogando dominó sob a sombra de uma mangueira, filhos, netos e bisnetos dos músicos. Olhando a fotografia, o mais velho do grupo reconheceu seu pai, o Mestre Firmo Santino. Descobrimos que éramos da mesma idade, que nossos pais foram amigos, músicos e contadores de histórias. Agora é nossa vez de ser o griô desta bela história.

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores