O Silêncio da Feira e a Dança Interrompida

O Silêncio da Feira e a Dança Interrompida

A feira de Baturité nunca mais será a mesma. Quem viveu aqueles dias sabe que havia um brilho especial nas tardes de sábado, quando Bia Dançarina transformava os corredores de barracas em um palco efêmero de celebração. Seu sorriso largo, seu gingado espontâneo e sua energia vibrante faziam do espaço um refúgio onde a rotina se dissolvia no ritmo da música. Bastava um acorde, um batuque, e lá estava ela, conduzindo o espetáculo sem ensaio, sem pretensão, apenas pelo prazer de viver o momento.

Seu nome corria pelas bocas dos feirantes, dos fregueses e, mais recentemente, dos internautas. No Instagram, seus vídeos eram um convite à alegria: improvisava coreografias, interagia com seguidores, exalava carisma. Não demorou para que seu encanto ultrapassasse os limites das feiras e se espalhasse pelas telas. Até o prefeito, contagiado por sua energia, aceitou o desafio e arriscou uns passos de forró ao seu lado, cercado pelo burburinho dos curiosos.

Mas o encanto foi brutalmente quebrado. A violência, que tantas vezes parece um fantasma distante, encontrou Bia e seu esposo, ceifando suas vidas sem aviso, sem sentido. A notícia se espalhou como um choque elétrico. As redes sociais, antes palco de sua alegria, se tornaram um mural de incredulidade e dor. “Sem acreditar”, escreveu uma seguidora. “Que Deus conforte a todos”, lamentou outro admirador. O luto tomou as ruas da cidade, e o silêncio substituiu os aplausos que a acompanhavam.

A tragédia que a levou, brutal e sem sentido, quebrou esse encanto. As ruas da cidade, acostumadas ao eco dos seus passos de dança, foram tomadas pelo luto e pela indignação. Não se tratava apenas da perda de uma mulher cheia de vida, mas do rompimento abrupto de uma história que ainda tinha muito a contar.

A banalização da violência armada no Brasil tem transformado tragédias como essa em meros números, estatísticas frias que ocupam espaço nas manchetes por um dia e logo dão lugar a novos horrores. Mas a vida de Bia não pode ser reduzida a isso. Seu talento, sua alegria e sua presença deixaram marcas profundas em quem teve o privilégio de conhecê-la, e sua morte não pode ser tratada como mais um caso entre tantos outros.

Aceitar essa realidade é permitir que a indiferença se instaure. Enquanto houver facilidade no acesso às armas e impunidade para os que espalham o medo, novas histórias serão interrompidas de forma injusta. O debate sobre a violência não pode mais ser adiado. É uma responsabilidade coletiva exigir segurança, justiça e respeito pela vida.

A feira sem Bia não será a mesma, mas sua memória precisa seguir pulsando. Que seu nome não seja lembrado apenas pelo fim abrupto, mas pela alegria que espalhou e pela urgência do alerta que sua ausência nos impõe. Dançava como quem entendia que o presente é tudo o que temos. Que essa lição permaneça.

Palmarí H. de Lucena

Deixe um comentário

Seu endereço de email não será revelado.