O Delírio Imperial de Trump: Gaza como Prêmio de Guerra

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O Delírio Imperial de Trump: Gaza como Prêmio de Guerra

A política sempre teve seus visionários e seus incendiários, mas poucos combinam ambas as características como Donald Trump. De volta ao centro do palco, ele agora lança uma proposta que oscila entre o devaneio expansionista e a brutalidade histórica: ocupar e reconstruir Gaza sob a bandeira dos Estados Unidos, transformando o território devastado pela guerra em uma reluzente “Riviera do Oriente Médio”. Ao seu lado, Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro israelense, sorria em aprovação, celebrando o que chamou de um ato de pensamento “fora da caixa”. O detalhe perturbador da equação, no entanto, se impõe com brutalidade — e os palestinos? Para Trump, a resposta é simples: eles deveriam partir.

A ideia flutua entre o absurdo e o sinistro. Mais de dois milhões de pessoas, sobreviventes de bombardeios, fome e deslocamento incessante, são tratadas como uma mera peça de tabuleiro em uma partida que Trump deseja jogar com as regras que lhe convêm. As nações árabes já rechaçaram qualquer possibilidade de absorver essa população, recusando-se a ser cúmplices de um deslocamento forçado que poderia reescrever a geopolítica regional com tintas sombrias. A proposta, ainda que envolta em jargões de reconstrução e progresso, soa, para muitos, como um eufemismo para limpeza étnica.

Trump sempre gostou de testar os limites do possível, e sua obsessão por expansão territorial não é novidade. Já demonstrou interesse em anexar o Canadá como o “51º estado”, reocupar o Canal do Panamá para conter a influência chinesa e até absorver a Groenlândia para ampliar o domínio estratégico dos Estados Unidos sobre o Ártico. Mas Gaza representa algo muito maior do que um capricho imperialista. Sua destruição é quase total — bairros inteiros foram apagados, a infraestrutura básica foi reduzida a escombros, a água e a eletricidade são luxos inalcançáveis. E, ainda assim, Trump sugere que a solução é simplesmente esvaziá-la, como se a terra fosse um terreno baldio à espera de novos proprietários.

Para Israel, uma ocupação americana poderia consolidar a derrota do Hamas e reforçar seu domínio sobre a região. Para a comunidade internacional, no entanto, a proposta tem o peso de um terremoto político. O Tribunal Penal Internacional segue com investigações sobre crimes de guerra na região, enquanto os países árabes deixam claro que qualquer plano para reconstruir Gaza precisa estar vinculado à criação de um Estado Palestino. Mas Trump, que sempre preferiu demolir a construir, não parece interessado em acordos que envolvam concessões. Seu novo embaixador em Israel, Mike Huckabee, um cristão sionista de convicções inflamadas, já sinalizou que a solução de dois Estados é uma ideia morta. E enquanto Trump reforça sua aliança com Netanyahu, a Arábia Saudita mantém sua posição: sem uma solução para os palestinos, não há caminho para a normalização com Israel.

O delírio expansionista de Trump esbarra em uma realidade inescapável. Nenhum plano de ocupação sobreviveria ao crivo da comunidade internacional sem severas condenações, e a remoção forçada dos palestinos geraria ondas de instabilidade que poderiam estremecer governos vizinhos, como Egito e Jordânia. Transformar Gaza em um paraíso turístico sem permitir o retorno de seus habitantes não passa de um projeto que flerta com o absurdo e a crueldade. A história já viu demais dessas páginas manchadas pelo desejo de apagar povos inteiros de seu próprio território.

Trump, que sempre se orgulhou de desafiar convenções, agora tenta reescrever as regras de um conflito que já carregava complexidades demais. Mas o destino de Gaza não pode ser decidido no delírio de um império em busca de novos territórios. O verdadeiro caminho para a paz nunca foi traçado sobre os escombros da injustiça.

Palmarí H. de Lucena

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