Nos últimos anos, a democracia dos Estados Unidos tem se deteriorado de forma preocupante. O retorno de Donald Trump à presidência em 2025 foi recebido com indiferença, como se o fato de a democracia ter sobrevivido ao seu primeiro mandato fosse prova suficiente de sua resiliência. No entanto, essa aparente normalização ignora os riscos crescentes que ameaçam as instituições políticas do país. A democracia americana já vinha sofrendo um declínio antes da reeleição de Trump, com a Freedom House reduzindo sua pontuação no índice de liberdade de 92 para 83 entre 2014 e 2021. Esse retrocesso reflete o enfraquecimento dos mecanismos de freios e contrapesos, enquanto Trump, agora mais experiente, com uma equipe leal e o controle absoluto do Partido Republicano, consolida seu poder e executa uma agenda abertamente autoritária, ameaçando opositores, reprimindo a imprensa e mobilizando as forças armadas para abafar protestos.
O futuro político dos EUA se aproxima do autoritarismo competitivo, um modelo em que as eleições continuam a ocorrer, mas o governo manipula as instituições para dificultar a competição justa, como já ocorre em países como Venezuela, Hungria e Turquia. A politização da burocracia estatal é um dos primeiros passos dessa transição. A “Schedule F”, um decreto que permite substituir milhares de servidores de carreira por aliados políticos, abre caminho para que agências como o FBI, o Departamento de Justiça e o IRS sejam usadas como instrumentos de repressão contra opositores. O uso seletivo da justiça para processar adversários também se intensifica, atingindo desde políticos até jornalistas e acadêmicos. Leis vagas sobre “terrorismo” podem ser aplicadas para revogar a isenção fiscal de organizações contrárias ao governo, limitando o financiamento de grupos de direitos civis e instituições acadêmicas.
A maior ameaça à democracia americana, no entanto, não é apenas a investida autoritária do governo, mas a passividade dos setores que poderiam resistir. Empresários que antes criticavam Trump agora buscam favores governamentais, temendo retaliação econômica. Corporações de tecnologia e mídia, que anteriormente financiavam iniciativas democráticas, evitam confrontos diretos, praticando autocensura. Esse ambiente de acomodação e medo favorece a consolidação do autoritarismo, pois regimes desse tipo prosperam quando a oposição é silenciada pela intimidação e pela desesperança.
Mesmo com instituições robustas, como o sistema judicial, a divisão de poderes e uma sociedade civil organizada, esses mecanismos só serão eficazes se houver uma resistência ativa. Regimes autoritários dependem do medo e da conformidade para se consolidarem, mas história mostra que esses sistemas só se mantêm enquanto não encontram oposição determinada. O macartismo e o racismo institucionalizado só foram superados nos EUA porque houve resistência. Agora, os americanos novamente enfrentam um momento crítico: aceitar um futuro de autoritarismo crescente ou agir para preservar a democracia.
Palmarí H. de Lucena