Na visão do jornalista Thomas Friedman do New York Times, os dois maiores conflitos mundiais têm uma explicação plausível: a Ucrânia busca se aliar ao Ocidente, enquanto Israel procura se aproximar do Oriente Árabe. A Rússia, com auxílio do Irã, tenta impedir o primeiro, enquanto o Irã e o Hamas atuam para evitar o segundo. Apesar de parecerem muito distintos, ambos os conflitos compartilham semelhanças significativas. Eles refletem uma batalha geopolítica de grandes proporções entre duas redes opostas de países e atores não-estatais, em busca da supremacia de valores e interesses em nosso mundo pós-pós-Guerra Fria.
De um lado, temos a Rede de Resistência, que defende a preservação de sistemas fechados e autocráticos, onde o passado prevalece sobre o futuro. Essa rede busca manter estruturas de poder consolidadas e resistir a mudanças que possam ameaçar seu domínio. Por outro lado, temos a Rede de Inclusão, que busca criar sistemas mais abertos, conectados e pluralistas, onde o futuro prevalece sobre o passado. Essa rede visa promover a inclusão, a diversidade e a cooperação global. A disputa entre as duas redes é crucial para determinar o curso da história neste período pós-pós-Guerra Fria.
É interessante notar que a China, sob a liderança do presidente Xi Jinping, encontra-se no meio dessas duas redes. Em termos de posicionamento, a China está dividida entre o coração (que tende a apoiar a Resistência) e a mente (que tende a apoiar a Inclusão). Isso mostra a complexidade e a ambiguidade das posturas políticas adotadas por alguns países.
A situação da Ucrânia é um exemplo claro dessa disputa. O país está tentando se desvencilhar da influência opressiva da Rússia e ingressar na União Europeia. Enquanto a Ucrânia busca um futuro mais aberto e conectado, Vladimir Putin, presidente da Rússia, busca impedir essa aproximação, temendo que sua autocracia seja ainda mais enfraquecida ao ver a Ucrânia, com sua riqueza em engenharia, forças armadas e produção agrícola, se juntar à teia europeia. No entanto, Putin não está sozinho nesta luta, contando com o apoio do Irã, Coreia do Norte, China, Belarus e muitos outros países do Sul Global que buscam manter o fornecimento de petróleo barato.
Outro exemplo ocorre no Oriente Médio, onde Israel busca estabelecer relações normalizadas com a Arábia Saudita, visando aprofundar seus laços com outros países árabes e muçulmanos da região. Essa aproximação é desejada tanto pelos israelenses quanto pelos sauditas, que aspiram a criar uma rede econômica que conecte a Ásia, África, Europa, o mundo árabe e Israel. Essa visão é semelhante a uma união europeia do Oriente Médio, onde a Arábia Saudita assumiria o papel de âncora, assim como a Alemanha na UE.
Por todas essas razões, este é um momento de grande perigo, assim como de grande oportunidade – especialmente para Israel. A competição entre a Rede de Resistência e a Rede de Inclusão significa que a região nunca esteve tão hostil ou tão disposta a aceitar um Estado judeu. Infelizmente, Israel traumatizado sob a liderança fracassada de Netanyahu, não consiga ver isso no momento. Se um dia Israel aceitasse um processo de longo prazo junto a uma Autoridade Palestina transformada, visando à construção de dois Estados para dois povos, poderia definitivamente inclinar a balança entre a Rede de Resistência e a Rede de Inclusão.
Esses exemplos mostram a importância das lutas entre as redes de resistência e inclusão na determinação dos rumos históricos do nosso tempo. O resultado dessas batalhas terá consequências significativas para o futuro das relações internacionais, da governança global e dos sistemas políticos em todo o mundo.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores