Mulungu é mais do que um simples ponto no mapa; é uma cidade que encapsula a essência da história e da cultura brasileira, profundamente enraizada nas terras que testemunharam tanto a colonização portuguesa quanto a presença ancestral dos povos indígenas nas margens do rio Mamanguape. O nome “Mamanguape” carrega em si um eco de mistério, com suas variadas interpretações, como “água pegajosa”, “bebedouro” ou “enseada dos mamangás”. Cada uma dessas definições acrescenta camadas de significado a um rio que foi, e continua sendo, uma testemunha e protagonista de uma saga histórica.
Desde os primeiros encontros entre colonizadores e populações nativas no século XVI, até a consolidação do domínio português após a Guerra dos Bárbaros em 1692, o rio Mamanguape desempenhou um papel central na expansão e desenvolvimento da região. Nos séculos seguintes, Mulungu experimentou momentos de grandeza e declínio, refletidos na proliferação dos engenhos de açúcar no século XVIII e nos desafios como secas e mudanças socioeconômicas que marcaram o século XIX. Esse ciclo de ascensão e queda revela muito sobre a dinâmica histórica da cidade, que oscilou entre o florescimento e a decadência, mas nunca perdeu sua essência.
A verdadeira alma de Mulungu, porém, reside na resiliência e capacidade de adaptação de sua comunidade. Eventos marcantes, como a inauguração da estrada de ferro da R.F.N. em 1823, a criação da Fazenda Camarazal no século XIX e a construção da primeira escola em 1955, são testemunhos de um espírito inquebrável de superação e progresso. Cada um desses marcos simboliza não apenas o desenvolvimento material, mas também o avanço de uma comunidade que se reinventa diante das adversidades.
A religiosidade sempre foi um fio condutor na história de Mulungu, evidenciada pela devoção a Santo Antônio, que resultou na construção de uma capela em 1943 e, posteriormente, na igreja de Santo Antônio. Esses templos não são apenas espaços de fé, mas também pilares da identidade e coesão comunitária, especialmente em tempos de transformação histórica.
Entretanto, é lamentável constatar a falta de preservação das inscrições rupestres ao longo do rio Mamanguape. Esses vestígios, que são testemunhos da rica história indígena da região, correm o risco de serem perdidos para sempre. A preservação desse patrimônio cultural é uma urgência que demanda um esforço conjunto, não apenas para proteger, mas para compreender plenamente as narrativas que essas inscrições carregam.
Mulungu, portanto, não é apenas uma cidade qualquer. É um microcosmo da história brasileira, onde passado e presente se entrelaçam em uma tapeçaria rica de narrativas e significados. Preservar e valorizar essa herança é mais do que um ato de justiça histórica; é uma forma de honrar aqueles que moldaram e continuam a moldar o tecido social e cultural desse lugar único, situado no coração da Paraíba.
Palmarí H. de Lucena, “Paraíba do Alto: Histórias e Imagens Aéreas”