Mídias sociais e democracia

Mídias sociais e democracia

Os autores da Constituiçao Americana, James Madison em particular, temiam a influência e poder de facções partidárias ou grupos de interesse que inflamassem animosidade mútua entres homens, fazendo-os esquecer do bem comum.  Presumindo que líderes de facções ou desagregadores pudessem acender chamas da discórdia em alguns estados, sem serem capazes de gerar uma conflagração entre eles, contemplaram mecanismos que servissem para desacelerar, pacificar e promover reflexão.

A tese de Madison provou ser duradoura e vital para a sustentabilidade da democracia americana, o que aconteceria se uma tecnologia aparecesse no começo do século XXI, trocando os parâmetros de vida política e social, no curso de uma década? A resposta é obvia, o que está acontecendo na América e outras democracias é precisamente o que James Madison tentou antecipar. Hoje, mídias sociais trazem progresso e ao mesmo tempo, grandes desafios a democracia. Aumentando a intensidade da animosidade mútua e a velocidade pela qual trocas de ofensas se propagassem.

Incialmente, a missão de Facebook era “fazer o mundo mais aberto e conectado”, assumindo-se nos primeiros tempos das mídias sociais, que um aumento global de conectividade seria fundamental para a democracia. O otimismo vem perdendo espaço com o passar dos tempos, sendo gradualmente substituído por uma crescente onda de decepções e descrença. Discursões online, frequentemente entre interlocutores anônimos, estão se transformando mais raivosas e menos civis do que aquelas na vida real. Redes de estranhos afins colaboram em criar visões de distopia, fomentando extremismo político, promovendo campanhas de desinformação, servindo de polos de circunscrição de seguidores passivos a conduta e ações violentas.

Alguns atribuem que o caos dos nossos tempos foi causado por Donald Trump ou políticos homônimos, que tudo voltará ao normal com a saída deles. Infelizmente, isso não está prestes a acontecer. Muitos parâmetros mudaram, contribuindo para a eleição de líderes autoritários, com tendências antidemocráticas. Se quisermos que a democracia suceda na era de crescente descrença da ideia de democracia, é necessário entendermos as diversas maneiras que as plataformas de mídias sociais funcionam nos dias de hoje, criando narrativas que são potencialmente hostis ao sucesso da democracia. Temos de agir democraticamente para melhorar as mídias sociais.

Para compreender a importância e influência das mídias sociais no debate político da atualidade, é preciso entender que elas representam um conceito muito mais amplo do que as chamadas redes sociais, abrangendo todos os canais ou ferramentas que promovem e facilitam a disseminação de conteúdos e mensagens de forma descentralizada. O grande desafio é poder precificar as vantagens e ameaças destas mídias ao Estado Democrático de Direito.

Palmarí H. de Lucena, membro da Uniao Brasileira de Escritores

Comentários

  • Kubitschek Pinheiro disse:

    Vc sempre escreveu muito bem. K

  • Marceleuze disse:

    Perfeita compreensão do que se estabeleceu como modus operandi social e individual, nos nossos dias. Ânimos acirrados, beligerância, e pouca preocupação com a realidade da vida nacional

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