A complexidade da nossa tarefa não nos escapa… Convite para proferir duas conferências na cidade de Cantão, na província de Guangdong, feito sem muita cerimônia ou detalhes. Empresários chineses estavam interessados em adquirir conhecimento e informações sobre os procedimentos licitatórios usados por organismos e bancos multilaterais. Em mira, bilhões de dólares gastos anualmente, na compra de bens e serviços para programas de reconstrução e desenvolvimento. Participação pequena da China, menos de 1,5% de todas as aquisições feitas pelo sistema da Nações Unidas em 2008. Processo licitatório complexo, seguindo rígidos critérios de transparência, neutralidade, imparcialidade e isonomia.
Contrato é um documento que confirma a existência de relações harmoniosas entre as partes, para os chineses. Somos amigos, agora podemos pedir favores mutuamente. Nada escrito no contrato é imutável. Qualquer relação é uma negociação contínua, inclusive as contratuais. Tudo pode e deve ser modificado, para ajustar-se ou ajustar as circunstâncias do momento.
Empresários ocidentais mais experientes, consideram um contrato com parceiros chineses como uma carta de intenção, sempre atentos às possíveis mudanças das condições. Quando um problema ocorre, as partes sentam-se cara a cara e tentam reconciliar suas diferenças através de intermediários, os “guanxi”. Ninguém disseca o texto ou convoca um advogado. Advogados? Advogados causam mais problemas do que resolvem. Esta é a percepção geral na Ásia, principalmente na China…
“Guanxi” é um sistema informal, político e organizacional na China, que incorpora uma complexa rede de relação social. Quando um empresário estrangeiro aproxima-se com uma solicitação ou oferta, a primeira coisa considerada é se existe um “guanxi” entre as partes. Caso não exista, pode solicitar a participação de um intermediário, de preferência uma pessoa de posição e bem conectada.
Empresários e contrapartes nacionais devem desenvolver estratégias e implementar táticas que aumentem sua influência e oportunidades de sucessos. “Guanxi” é geralmente fortalecido pelo aumento deliberado de interações sociais entre as partes, incluindo visitas, presentes e convites para banquetes ou ocasiões especiais.
Iniciado o “guanxi”, os indivíduos ou organizações devem continuar o relacionamento com uma ou mais pessoas em comum, formando uma rede interpessoal indispensável aos negócios. A reciprocidade e a confiança são duas normas fundamentais na cultura chinesa.
Procedimentos e regras de licitação internacional são vistos como desincentivos a uma maior participação da China no mercado do sistema das Nações Unidas. Governo e empresariado demonstram interesse em modificar a maneira tradicional de obter negócios, abrindo as portas para licitações abertas e competitivas…
Nosso convite, no entanto, foi feito por pessoas e organizações com as quais havíamos estabelecido e mantido “guanxi”, há vários anos. Jamais haveríamos chegado, sem ele, a uma atividade promovendo regras de licitação internacional, que negassem os seus princípios básicos.
Na China, para ser bem sucedido o empresário estrangeiro deve aprender a ter paciência para compreender e aceitar as diferenças, além de estabelecer um “guanxi”. O que os chineses denominam “a arte de mascar sementes de girassol”…
PalmariH. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores