Entre as grandes conquistas políticas e culturais da democracia ocidental está ideia de ¨cargo público¨, a ideia de que seus ocupantes têm a responsabilidade de assegurar que decisões tomadas no exercício da função sejam para o benefício de pessoas e não para o beneficio próprio. Em democracia, essa prática é caracterizada como um conflito de interesses, um potente vetor da corrupção.
Problematicamente, a legislação estabelecendo princípios e regras sobre a conduta de ocupantes de cargos públicos falha em grande parte ao demarcar uma fronteira nítida entre o interesse pessoal e o interesse público. Corremos, portanto, o risco de definir erroneamente o que é genuíno interesse político, como sendo interesse pessoal. Crescentes dificuldades são evidentes no número de disputas de mandatos diante tribunais eleitorais, como também nas reviravoltas que ocorrem em consequência de ambiguidades em julgamentos pré e pós-eleitorais.
Participação cidadã em causas ou organizações cívicas habilita a pessoas que demonstram qualidades de liderança e comprometimento a participar no processo eleitoral, para defender os interesses de uma organização ou grupo de pessoas. Tais escolhas são genuinamente o marco zero de muitas campanhas eleitorais para câmaras municipais e outras entidades mais próximas à democracia descentralizada. O ditame político norte-americano: ¨toda política é local¨, reflete certa intimidade entre os interesses de um politico e os daqueles que são seus eleitores.
Leis promulgadas para proteger o interesse comum às vezes carecem de claridade, paradoxalmente, podem ter um efeito antidemocrático contrário, à intenção dos seus proponentes. Participação direta em uma campanha para a melhoria da comunidade e a subsequente eleição de um dos seus beneficiários, pode comprometer a imagem ou sugerir um aparente conflito de interesse. Caso se considere, ou seja, percebido como uma parte interessada, sua abstenção não somente nega seu direito a um serviço público como também frustra as aspirações das pessoas que o elegeram.
Política em uma democracia é sobre interesses como também princípios. Dicotomia esta, mais presente nas câmaras municipais do que em qualquer outro nível de governabilidade. Decisões têm invariavelmente uma relação com a propriedade ou assuntos que afetam o contribuinte diretamente. Daí a necessidade de eleger pessoas com a capacidade e o comprometimento de encontrar soluções democráticas, onde os interesses públicos e pessoais se interpõem podendo causar uma aparência de conflito de interesse.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores