O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem defendido o protagonismo do “Sul Global”, mas essa tentativa de divisão do mundo é considerada imprecisa e contraditória por analistas. Isso se deve ao fato de que o eixo proposto por Lula inclui países com diferentes posições políticas, econômicas e culturais.
Uma das diferenças observadas é a promoção do sistema democrático, que não é necessariamente um valor associado ao Sul Global. Por exemplo, a China, uma superpotência dentro desse eixo, pode ser classificada como uma ditadura. Da mesma forma, países como Nicarágua e Venezuela fogem da norma na América Latina. Na África, a Rússia está ampliando a crise do sistema democrático no Sul, em meio à disputa do Norte por influência.
Segundo especialistas, é difícil caracterizar com precisão o chamado Sul Global, pois são países tão diversos que é complicado estabelecer uma identidade comum. O diplomata Rubens Ricupero afirma que o Brasil tem seu próprio peso e pode falar por si mesmo, em vez de se tornar porta-voz de uma entidade inexistente no mundo.
Embora a ideia de Sul Global seja vaga, Lula e outros líderes têm evocado a expressão para se referirem a uma parte essencial da solução das crises globais. No entanto, essa expressão também é usada no Ocidente, como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que criticou a Rússia pela guerra na Ucrânia, ressaltando o impacto na cadeia global de alimentos.
O termo “Sul Global” surgiu na década de 1980 com o “Relatório Brandt”, que mostrava as divisões do mundo com base no PIB e na população. Os países mais pobres, em sua maioria ex-colônias, estavam concentrados no Hemisfério Sul. Porém, essa expressão passou a ser usada como sinônimo de “países em desenvolvimento” ou “terceiro mundo”.
Atualmente, o termo vem sendo usado para englobar não apenas países em desenvolvimento, mas também aqueles com baixa renda. É uma forma de se referir a esses países de maneira mais coordenada. No entanto, o Sul Global não é um grupo organizado, como o G77+China. É mais uma expressão retórica sem critérios precisos de inclusão.
Para alguns analistas, incluir a China como parte do Sul Global é duvidoso e arriscado, considerando a rivalidade com os Estados Unidos. Em um eixo tão heterogêneo, é difícil encontrar uma unidade, e os países correm o risco de parecerem alinhados nessa disputa de potências.
Além disso, a crise do sistema democrático é mais evidente no Sul Global, como mostra o mapa baseado no relatório anual sobre democracia. A China aparece como uma ditadura, enquanto países como Brasil e África do Sul são considerados democracias falhas. Portanto, a promoção da democracia não serve como ponto de união no Sul Global, diferentemente do que ocorre na América do Sul.
Em conclusão, a ideia de Sul Global deveria ser usada com moderação para evitar generalizações. É difícil estabelecer uma identidade comum nesse grupo heterogêneo de países, e a inclusão da China pode ser questionável. A diversidade dos regimes políticos e a qualidade dos governos também variam entre os supostos membros do Sul Global. Portanto, é importante analisar com cautela essa divisão do mundo.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores