Fomos informados de que seriamos atendidos por Phillips, um agente de viagem fluente em Inglês, antes de partirmos para a China. Descobrimos logo que seria impossível comunicar-se. O funcionário simplesmente repetia saudações em Inglês, nome da companhia aérea e numero dos nossos vôos, em ritmo stacatto. Pedimos mais detalhes, repetidamente. Respostas incompreensíveis. Meia hora depois… Entendeu que queríamos o código da reserva. Não conseguindo soletrar as letras e os números, nos enviou as informações por e-mail. Tínhamos um ticket pré-pago, nosso vôo partia em menos de duas horas.
Chegamos. Estrada do aeroporto de Guangzhou, Sul da China. Viagem de uma hora até o centro da cidade. Árvores e jardins bem cuidados. Poluição visual maculando a beleza do verde. Outdoors em ambos os lados da estrada. Caracteres chineses com tradução em Inglês, pintados quase sempre em vermelho e dourado, as cores de boa sorte. Negócios, negócios, negócios…
Grande outdoor nos chamou à atenção. Caracteres com tradução em Inglês, sem desenhos ou gráficos: “Hospital for Male Disorders” – Desordens masculinas? Gestos tímidos, porém descritivos, nossa acompanhante não poupou esforços para explicar as especialidades disponíveis no hospital. Deduzimos enfim três possibilidades: um serviço de urologia, uma clinica para disfunção erétil ou talvez algo mais genérico, masculino. Tradução confusa, indicativa das dificuldades que os chineses têm em comunicar-se com estrangeiros.
Segundo o governo, mais de 250 milhões de chineses estudam Inglês, ou seja, um em cada cinco dedica-se ao aprendizado. Autoridades e organizações locais patrocinam cursos intensivos para seus funcionários e colaboradores, que são pressionados constantemente a comunicarem-se melhor com visitantes. Resultados nem sempre satisfatórios. Decoram frases que são repetidas, sem possibilidade de diálogo, fora do vocabulário que aprenderam. “Welcome to take taxi! Do you like me? Do you like shopping? Look happy! Do you like first time in China? You are my best person! Long time no see. You like warm dog?” Bem-vindos ao Chinglish…
Anúncios e cardápios bilíngües são quase sempre incompreensíveis, às vezes, com resultados hilários. Traduções literais feitas baseadas nos caracteres chineses ou por softwares especiais. Pratos como: “husband-and-wife lung slices – fatia de pulmão de marido e mulher”; chicken without sexual life – frango sem vida sexual ou three fresh things from the ground – três coisas frescas do chão” são listados nos cardápios entre uma enorme variedade de opções gastronômicas. O visitante não tem outra opção a não ser comer prá ver…
Placas em lugares públicos contribuem enormemente para a confusão criada pelo Chinglish e sua grande popularidade com comediantes estrangeiros e aficionados da língua. Um hospital em Peking chamava-se “Hospital for Anus and Intestine Desease”, ou seja, Hospital para Anus e Doença do Intestino. Renomeado recentemente como “Dongda Proctology Hospital – Hospital de Proctologia de Dongda”. Entre as mais notórias, as afixadas em sanitários públicos com dizeres como “teliot” ou “urine district” – distrito da urina. Mais de 10.000 já foram substituídas pelo governo, em Xangai, um esforço louvável, mas longe de mudar as frases ou palavras institucionalizadas pelo Chinglish.
Madrugada do dia 20 de Junho, Brasil versus Costa do Marfim. Tentávamos inutilmente ligar a televisão, mas o controle remoto não trocava de canal. Chamamos a camareira para resolver o problema. Descobrimos logo que não falava Inglês. Repetimos varias vezes a palavra “football”, sem lograr nenhuma reposta. Só sorrisos. Desesperados, chutamos uma pequena almofada enquanto repetíamos a palavra. Apanhou a almofada e dirigiu-se à porta, com uma expressão de missão cumprida na face. Após múltiplas tentativas e erros, conseguimos nosso intento. Infelizmente, o Brasil já havia feito o primeiro gol. A partida seguia narrada entusiasticamente em Chinês. Fala Galvão! Please…
China 2010