Desenvolvimento insustentável

Espelho d’água da rua alagada, mistura de água de chuva e esgoto, refletindo as silhuetas de edifícios novos e as poucas arvores que ainda restam. Infraestrutura urbana antiquada sobrecarregada pela expansão demográfica e carência de serviços básicos. Desenvolvimento urbano predatório destruindo paulatinamente as poucas coisas que salvamos do passado, pausando raramente para conservar o pouco que ainda restara. Oceano poluído, a vida que nele habita sobrevivendo precariamente às temperaturas crescentes do deserto líquido em formação. Insegurança nos impedindo de passear na calçadinha, socializar com amigos ou sentarmos à sombra de um coqueiro degustando a sensação adstringente de um caju maduro. O mar é a nossa testemunha…

Pequena rua onde vivíamos, porto seguro para reflexões e vôos livres a procura de lugares e pessoas escondidas na topografia complexa da nossa memória. Convivíamos com pessoas de todas idades, compartilhávamos o espaço urbano sem atritos ou receios. Pontilhando nosso trajeto diário, pontos de congregação social, marcos humanos. Aposentados discutindo os problemas da previdência social, adultos e crianças compartilhando momentos de alegria e aprendizado mútuo, caminhantes e corredores desafiando obstáculos humanos, namorados ensaiando os primeiros beijos. Sabíamos de tudo, conhecíamos todos. Mas tudo mudou…

A calçadinha da orla transformada em um cenário para os magos do marketing e da propaganda. Enquanto isso, ruas transversais e paralelas são alagadas frequentemente expondo as pessoas a vetores de doenças. Centenas de ônibus de turismo destruindo a superfície das ruas, entorpecendo o fluxo de veículos e ameaçando a qualidade de vida dos residentes. Comedores informais sem cumprir os conceitos básicos de higiene. Juntando-se as intempéries do cotidiano, veículos e sistemas de som poluindo nosso meio ambiente. E ainda chamamos a tudo isso desenvolvimento sustentável!

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores