Estamos quase acostumados a ver políticos e empresários envolvidos em escândalos de corrupção sendo absolvidos ou recebendo penas leves, enquanto pessoas comuns são condenadas por crimes menores. Isso gera um sentimento de impunidade e desigualdade perante a lei e fortalece a reação tímida da sociedade às tentativas de enfraquecer ou mesmo demonizar a instância constitucional responsável por proteger seus direitos. Acrescenta-se a desigualdade da justiça brasileira, o problema da superlotação dos presídios, muitos presos pobres e negros aguardam meses, e até mesmo anos, por um julgamento, vivendo em condições precárias e desumanas.
É preciso buscar soluções para tornar a justiça mais acessível e eficiente para todos os brasileiros. Isso inclui investimentos na infraestrutura do poder judiciário, melhoria na formação e capacitação dos juízes, promotores e advogados, bem como a implementação de políticas públicas que promovam a transparência e o combate à corrupção. A justiça é um dos pilares fundamentais de uma sociedade democrática e não pode ser vista como um privilégio para poucos. É de vital importância lutar por uma justiça que seja realmente justa e igualitária, capaz de garantir os direitos e a dignidade de todos os cidadãos. Somente assim poderemos construir uma sociedade mais justa e livre da impunidade.
Outra dimensão do problema da desigualdade é o uso abusivo de raciocínios matemáticos por parte dos economistas, que frequentemente utilizam números e teorias econômicas sem considerar questões de justiça, bem comum e equidade. Raramente são feitas revisões ou correções de curso por parte dos economistas, que preferem manter seus interesses e privilégios intactos. O uso demagógico da linguagem matemática, aliado a indicadores econômicos como o PIB e às políticas do Banco Central, contribui para o aumento da desconfiança em relação ao uso político desses números, fortalecendo a descrença na argumentação lógica baseada em dados e provas, resumida na frase popular “[…] os números não mentem, mas os mentirosos fabricam números”.
A demagogia tornou-se uma doença crônica frequente na democracia, suscetível à manipulação da linguagem em temas populistas, redes sociais e politização da fé. Demagogos e seus seguidores se utilizam das redes sociais para reforçar aquilo que prevalece sobre a razão, apesar da sociedade como um todo de ter responsabilidade nessa situação, uma vez que assinamos um contrato social e participamos da sua construção. O processo de diferenciação social e a humilhação dos mais vulneráveis despertam o desejo de agir em conjunto, independentemente das qualidades morais, mas poucos aceitam esse desafio, preferindo manter seus privilégios enclausurados, protegidos pela espessura socioeconômica de suas respectivas bolhas.
A diferenciação social no Brasil e no mundo tem causado humilhação, desprezo, ironia e silenciamento dos pobres e dos imigrantes. Isso desperta nos mais desprivilegiados, independentemente de suas características morais, o desejo e a vontade de união e ação coletiva, a fim de usufruir do poder e da força provenientes dessa união. Como resultado, a ciência e os grandes consensos são menosprezados, transformando o mundo digital em um terreno propício para a manipulação da linguagem, permitindo que demagogos se organizem na rede, reforcem estereótipos já cristalizados culturalmente, resistam a mudanças, ignorem anseios do oprimidos e desvalorizem instituições democráticas. Este é o grande desafio que a humanidade enfrenta.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores