Consequências não-intencionais do fechamento de hospitais de custódia  

Consequências não-intencionais do fechamento de hospitais de custódia  

Pessoas com problemas psiquiátricos que cometerem crimes não serão mais tratadas em hospitais psiquiátricos, de acordo com a resolução No 487 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que entrou em vigor em 15 de maio de 2023. A resolução determina que pessoas com transtorno mental ou deficiência psicossocial, que cometeram delitos e são consideradas inimputáveis ou incapazes de entender a ilegalidade de suas ações, sejam tratadas pela rede de atenção psicossocial do SUS, em vez de hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico. Essa resolução não segue fielmente a condenação do Brasil na Corte Interamericana, que não determina a extinção dos hospitais de custódia.

De acordo com a resolução, o tratamento ambulatorial terá prioridade em relação à internação de pessoas em estabelecimentos de custódia e tratamento psiquiátrico no Brasil. A decisão será tomada caso a caso, com base em análises clínicas e acompanhamento judicial, além de estabelecer que, em um prazo de seis meses após sua publicação, as autoridades judiciais competentes deverão interditar parcialmente esses estabelecimentos, transferindo os pacientes para albergues ou instituições similares, proibindo novas internações em suas dependências. Após 12 meses após de sua entrada em vigor, essas instituições devem ser totalmente interditadas e fechadas.

Segundo entidades médicas especializadas, a desativação dos hospitais forenses trará consequências trágicas à população brasileira. Isso ocorre porque o CNJ sugere que esses pacientes sejam tratados em locais como hospitais gerais, Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT), no entanto, essa decisão sobrecarregará a rede básica, que claramente não possui estrutura adequada para oferecer atenção específica a transtornos mentais, principalmente por longos períodos. Além disso, a opinião médica não está sendo considerada no que diz respeito à perícia, internação, acompanhamento e avaliação desses pacientes.

A desinstitucionalização de pacientes mentais ocorreu na Califórnia, nos anos 1960 e 1970, com o fechamento de grandes instituições psiquiátricas e a transição dos pacientes para cuidados de saúde mental na comunidade. Essa mudança foi parcialmente motivada pelo filme “Um Estranho no Ninho”, que despertou um debate sobre o tratamento de doentes mentais e a necessidade de humanizar e reavaliar os métodos aplicados, em vez de adotar abordagens coercitivas e punitivas. No entanto, durante a transição para a vida comunitária, os pacientes desinstitucionalizados não receberam o apoio adequado, o que resultou no aumento do número de pessoas em situação de rua, chegando a 171.500, o equivalente a 30% do total do país.

É preocupante notar que entidades médicas não foram consultadas pelo CNJ a) em relação a uma resolução que pode impactar profundamente os serviços de saúde mental e segurança pública. A falta de capacidade do SUS em atender essas pessoas tem consequências não intencionais, como o abandono do tratamento médico, o aumento da violência e da criminalidade dentro e fora das prisões, a precarização do tratamento de encarcerados com problemas mentais e o fato de que 63% das prisões brasileiras não possuem um módulo de saúde para atender os detentos.

Ao não considerar a opinião e a experiência de profissionais da saúde, o Estado Brasileiro está embarcando em mais uma aventura burocrática. Os benefícios dessa resolução são questionáveis em termos de saúde pública, pois expõem uma parcela da população a problemas sociais e de segurança pública causados por decisões políticas equivocadas. Além disso, não houve a mínima participação daqueles afetados ou essenciais na mitigação de problemas de saúde mental, tanto dentro quanto fora dos hospitais de custeio. Decisão lamentável de consequências duradouras.

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores

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