Vários governos e seus parceiros têm pintado fachadas e praças, com comunicados bombásticos anunciando medidas paliativas para encobrir o legado da negligência e da culpa pela morte gradual do Centro Histórico, da terceira cidade mais antiga do Brasil. Restauros superficiais politicamente motivados, seguidos por atos de vandalismo e pichações, recriando assim o ciclo de restauro/abandono tão comum em áreas urbanas, com a presença mínima dos órgãos do poder público, calçadas perigosamente vazias e a ocorrência da degradação difusa de espaços de relações sociais e interações cotidianas.
Desde a criação da Comissão Permanente para o Desenvolvimento do Centro Histórico, em 1986, vários projetos foram anunciados com grande pompa e circunstância, mas tiveram resultados assimétricos em relação às expectativas geradas por seus benfeitores do momento. Bares e negócios que abriram na Praça Antenor Navarro, após melhorias financiadas pelo Governo da Espanha, obtiveram sucesso limitado devido à insegurança, manutenção inadequada, falta de comprometimento por parte da edilidade.
Em 2013, a Presidente Dilma anunciou a disponibilização de R$ 50,7 milhões pelo Governo Federal para a revitalização do Centro Histórico, sendo que 60% do financiamento seria destinado para projetos no Porto do Capim. Ali, às margens do Rio Sanhauá, foram construídas as fundações da história da nossa cidade. Porém, uma década após o anúncio, a implementação da maioria dos projetos incluídos no financiamento ainda está em discussão ou apenas anunciada ad nauseam por subsequente administrações municipais.
Enquanto isso, o abandono e a destruição de logradouros e imóveis históricos ameaçam negativamente a beleza restante do Centro Histórico e põe em risco sua sustentabilidade econômica e viabilidade como um importante marco do turismo paraibano. A urbanista Jane Jacobs, em seu livro “Morte e vida das grandes cidades” (1961), ressalta as ricas pré-existências de cidades multifuncionais, compactas e densas, onde as ruas, os bairros e as comunidades são vitais para a cultura urbana. Ela afirma que “manter a segurança da cidade é tarefa principal das ruas e das calçadas”.
Quando se trata de imóveis abandonados ou em processo de desmoronamento, deve-se pensar além de restauro ou da requalificação de logradouros. É prioritário investir na instalação de iluminação adequada, melhorias no transporte público, construção de miniparques, faixas de ciclismo, moradia adequada, oportunidades de trabalho para pessoas vivendo em condições precárias e espaços de convívio. O poder público carece de criatividade e coragem política para encarar a multiplicidade de problemas causando a decadência de áreas urbanas, muitos criados pela ausência do poder publico.
Postagens nas mídias sociais, visitas técnicas de secretários municipais e edis, coro grego de turistocratas, anunciam convênios, novas parcerias, mutirões de remoção de pichações, carta de intenções, retomada de várias obras “in progresso” por quase uma década e planos mirabolantes de requalificação de logradouros de grande importância histórica, como o Ponto de Cem Reis, Pavilhão do Chá, Praça João Pessoa, ações anunciadas ou parcialmente realizadas por várias administrações municipais. Aparentemente seguindo a lógica do personagem Il Gattopardo de Giuseppe di Lampedusa, “Se queremos que tudo continue como está, é preciso que tudo mude.”
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores