Cerume da indiferença

Pacto de amizade entre o Capitão João Tavares e o índio Piragibe, o então morubixaba dos Índios Tabajaras, começando a história da nossa cidade. Acordo firmando no dia 5 de agosto de 1585 numa colina à direita do rio Sanhauá, confirmando o domínio português sobre a área conhecida hoje como o Centro Histórico da capital. Servindo quase quatro séculos como o âmago da vida metropolitana, antes de sua mutação para uma selva de imóveis abandonados, cursos d’água poluídos, ocupações ilegais e escassez de pujança econômica. Decadência e abandono evidenciados pelos resquícios e as sequelas do Lixão do Roger, uma monstruosidade criada pela prefeitura municipal no manguezal adjacente à margem do rio onde a cidade nascera e prosperara.

O Lixão do Roger recebera todos os resíduos sólidos produzidos na capital por mais de quatro décadas, fechando eventualmente no ano de 2003. Problemas ambientais e de saúde pública resultantes do manejo inadequado e a concomitante poluição de águas subterrâneas e fluviais, permanecendo como um impedimento à recuperação e requalificação do terreno como um parque urbano e área de lazer. Pessoas vivendo precariamente ainda são visíveis, muitos ocupadas na triagem de resíduos, crianças brincando em meio à poluição, pessoas usando o rio para lazer e a pesca expondo-se a riscos de saúde e aos efeitos letais da negligência maléfica do poder público.

Empurra-empurra entre os órgãos meio ambientais, neutralizando qualquer possibilidade de resolução dos problemas no entorno do Lixão do Roger. Alegando um problema jurisdicional, a secretaria estadual mantém uma postura de não interferência, ao mesmo tempo, a edilidade se diz incapaz de retomar o projeto do parque urbano devido a falta de dotação orçamentária e a desatualização da proposta original, limitando suas ações a investigações de denúncias de poluição. Cúmplices na destruição de mais de quatro séculos de história, sem nunca aceitar responsabilidade pela degradação ambiental causada pela poluição dos nossos rios e chão comum.

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores