O portal mágico da Serra do Moura

Photo by Palmarí de Lucena
O portal mágico da Serra do Moura

Bananeiras é uma cidade privilegiada por um clima ameno, relevo europeu e uma rica história ligada intrinsecamente aos ciclos econômicos da região e à religiosidade do seu povo. Caminhando pelas suas ruas estreitas, cheias de casarões antigos ou por trilhas ecológicas, respirando o ar puro da sua natureza verde, o visitante se sente em comunhão com um passado que faz o presente tão atraente.

Nosso amigo, um bananeirense convicto, imaginava o corte rochoso no topo da Serra do Moura como uma espécie de portal virtual – um lugar mágico. Ponto de partida para seus voos de imaginação pelos meandros e mistérios da adolescência. Narrativas que deleitavam e enriqueciam nossas imaginações. Sentíamo-nos na companhia das musas de Bananeiras, verdes sempre verdes, guiando-nos pelas lendas das ruas, praças e veredas escondidas pelo nevoeiro ou perdidas nas falhas da memória.

Cine Excelsior, um pequena casa de espetáculos na praça central e um coreto construído sobre o canal que cruza a cidade, criam o recanto fantasiástico por onde todas as suas histórias começam ou convergem. Foi lá que nasceu a sua paixão pela sétima arte. Doublé de censor e proprietário da casa, Padre José, assistia sozinho todos os filmes antes de serem exibidos ao público. Munido de instruções precisas e religiosamente corretas, Zé do Padre, um projecionista de mão ossuda e nodosa obstruía todas as cenas que não haviam passado pelo crivo austero do seu mentor. Beijos, abraços, cenas de boudoir, às vezes uma mera troca de olhares entre um homem e uma mulher, eram bloqueados sem nenhum respeito à criação artística ou ao roteiro do filme. Bananeiras produzia uma Hollywood sem sexo ou sensualidade.

Leques perfumados, acessórios de rigueur do público feminino, socializavam flagrâncias francesas com movimentos sutis, muitas vezes comunicando paixões ou mensagens românticas. A linguagem expressada em cada movimento escapava à censura do padre. Romance era possível em Bananeiras mesmo sem beijos, olhares ou abraços hollywoodianos.

O filme ¨E o vento levou¨ mudou tudo. Acessórios femininos, mesmo aqueles perfumados, foram usados para ¨reservar¨ lugares para as senhoras da sociedade, madeira e tijolos marcaram assentos para os demais. O sistema causou grande consternação por ser. considerado como favoritismo por muitos dos aficionados, o filme voltou a ser exibido ¨sem reserva de lugar” pela primeira vez. O vento não passou em vão na Serra do Moura …

Palmarí H. de Lucena, membro da Uniao Brasileira de Escritores