Inquestionavelmente, Casapueblo é uma das joias turísticas de Punta del Este e um dos mais belos cartões postais do mundo. Muito mais que um museu ou ateliê, é também o refúgio, o lar e a obra-prima de Carlos Villaró, o multifacetado artista uruguaio que a concebeu. Conhecido por suas telas abstratas, Villaró aventurou-se ainda em múltiplas formas de expressão artística, da escultura à arquitetura, do cinema à literatura e à música. Grandes nomes da cultura, como Jorge Amado e Vinicius de Moraes, o encorajaram a publicar suas obras literárias: La Casa del Negro, Bahia, Candango e Mediomundo. Sua colaboração com Albert Schweitzer no leprosário de Lambaréné, na África, revela o coração humanitário que pulsava por trás de sua criatividade.
Casapueblo, com suas abóbadas brancas e suas cumeeiras que desafiam a gravidade ao emergir de uma escarpa íngreme, evoca a ousadia arquitetônica de Gaudí, aliada às influências de Pablo Picasso e Salvador Dalí, artistas que Villaró conheceu na juventude. As vibrantes tonalidades e os traços arrojados que adornam a construção trazem ecos da África, mesclados aos rituais do candomblé que tanto impregnaram a cultura uruguaia. Ao cruzar seus portais, é impossível não se deixar impressionar por essa monumental obra. Casapueblo, sem linhas retas, abraça o mar e as rochas como uma entidade viva, em eterna expansão.
Entre os frequentadores ilustres da casa, destacava-se Vinicius de Moraes, grande amigo de Villaró. Inspirado pela singularidade da construção, o poeta brasileiro escreveu a emblemática canção A Casa: “[…] Era uma casa muito engraçada. Não tinha teto, não tinha nada […]”.
Visitar Casapueblo é se entregar a uma experiência sensorial incomparável. Os andares, numerados de forma negativa, desafiam a lógica tradicional enquanto o visitante desce da recepção para o seu quarto, atravessando um labirinto esculpido na rocha, onde paredes ora de pedra, ora de alvenaria, revelam o espírito criativo do artista. Os corredores estreitos convidam à exploração, e cada detalhe parece contar uma história, enquanto as varandas oferecem vistas deslumbrantes de Punta Ballena, perfeitas para contemplar o oceano que se estende ao longe. No terraço, desfrutando de uma refrescante sangria de vinho branco, deixamo-nos envolver pela serenidade que só o cair da tarde traz consigo.
O entardecer, aliás, é o momento de maior magia em Casapueblo. Diariamente, os visitantes são convidados a participar da Cerimônia do Sol, um evento quase místico em que o poema de Villaró, narrado por ele mesmo, ecoa em reverência ao astro-rei. O sol, eterno companheiro do artista, era sua fonte de inspiração e diálogo, independentemente de onde suas viagens o levassem. Em meio ao silêncio que reina, sobrepondo-se ao assovio do vento e ao murmúrio das ondas, gaivotas e andorinhas sobrevoam o terraço, como se também participassem dessa celebração. No instante exato em que o sol desaparece no horizonte, há uma pausa, um respiro de comunhão entre arte e natureza.
Carlos Villaró partiu da Casapueblo, fundindo-se ao sol que tanto amou em vida. Sua obra, porém, permanece. E com ela, sua alma.
Palmarí H. de Lucena