Lançada na Alemanha em 1957 pela empresa Chemie Gruenenthal, a Talidomida foi comercializada sem receita médica, como um sedativo e hipnótico isento de efeitos adversos e seguro, para combater enjoos matinais em mulheres grávidas. Usada por milhares de mulheres em 46 países, não foi aprovada para o mercado norte-americano devido a questionamentos das autoridades sanitárias dos EUA, sobre ensaios clínicos inadequados realizados pela empresa. Eventualmente o remédio foi removida das prateleiras de farmácias em 1962, após constatação cientifica de 10.000 casos de defeitos congênitos dos chamados de “bebês da talidomida”.
Resistência politica a medidas de achatamento da curva de contágio do COVID-19, está provocando uma ressurgência à navegação por águas desconhecidas da ciência. Aventuras guiadas por evidência anedótica e pesquisas superficiais sobre a eficácia de remédios não testados com devido rigor cientifico, aprovados para a prevenção e tratamento da doença. Enquanto níveis de contágio e mortalidade crescem exponencialmente em praticamente todas faixas etárias do País, o presidente brasileiro continua demonizando medidas preventivas com narrativas negacionistas e pseudo-argumentos constitucionais. Nos EUA, narrativas semelhantes têm estimulado a invasão de espaços públicos por grupos extremistas armados e a abertura ilegal de negócios considerados não essenciais por autoridade locais.
Resultados do maior estudo já feito sobre tratamentos com cloroquina e sua derivada hidroxicloroquina, revelaram após analise de mais de 96.000 pacientes em 671 hospitais do mundo afora, que os medicamentos não aparentam fornecer nenhum benefício a pessoas suspeitas de contágio ou internadas com COVID-19, pelo contrário, aumentam o risco de arritmias e de óbito. Apesar da evidência científica robusta, ambos continuam sendo promovidos por Donald Trump e espelhado obsequiosamente pelo Presidente Bolsonaro, em desafio direto a achados científicos e recomendações da própria OMS.
A experiência da Talidomida parece estar se repetindo, apesar de evidência cientifica esmagadora sobre os efeitos adversos dos antimalariaís e possível acirramento de tensões intercomunais causadas pela falta de lógica, nutrida pela politização da pandemia. Narrativas no vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, não substanciam a existência de uma pauta cientifica sobre a prevenção, testagem ou reabilitação de populações afetadas pela pandemia, postura amplamente demonstrada na mudança do foco do Ministério da Saúde para um serviço de Intendência Militar.
Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores