A Liberdade Empacotada: O Símbolo Vendido

A Liberdade Empacotada: O Símbolo Vendido

A Estátua da Liberdade, erguida como um santuário à esperança, trouxe consigo, desde sua concepção, a promessa de um mundo mais acolhedor. “Dai-me os seus cansados, os seus pobres, as suas massas aglomeradas ansiando por respirar em liberdade.” Estas palavras, imortalizadas na base do monumento, ressoam como um apelo à humanidade, um convite para que todos aqueles que buscavam refúgio encontrassem nela um farol.

Mas, como pode um símbolo tão carregado de significados ser reduzido ao mero status de propaganda comercial? No Brasil, a rede de lojas Havan apropriou-se da imagem da Estátua da Liberdade, não como homenagem ao ideal de acolhimento e justiça social, mas como instrumento publicitário, adornando suas fachadas com réplicas que se multiplicam pelo país. O paradoxo é gritante. O que deveria ser uma evocação à dignidade dos desamparados torna-se, ironicamente, uma alegoria ao consumo.

O contraste entre o uso da estátua e seu significado original não poderia ser mais profundo. Ali, onde se esperaria a lembrança dos que um dia vieram em busca de um futuro, ergue-se agora um simulacro desprovido de alma, parte de uma engrenagem que celebra apenas a liberdade de comprar. A verdadeira promessa da estátua — a de acolher os rejeitados e erguer os caídos — dá lugar a uma ilusão de liberdade, condicionada ao poder de consumo.

Em cada uma das mais de setenta cidades onde as réplicas da Estátua da Liberdade da Havan se erguem, essa contradição se reafirma. Os visitantes posam para fotos, capturando em suas lentes uma versão empobrecida do monumento original, enquanto o verdadeiro espírito das palavras de Emma Lazarus permanece esquecido, sufocado sob o peso da mercadoria e da publicidade.

Talvez, mais do que nunca, seja o momento de refletirmos sobre o significado e o uso desses símbolos. Não se trata apenas de uma questão estética ou comercial; é uma questão de preservar a memória e o valor do que eles representam. Quando se transforma a Estátua da Liberdade em uma bandeira do consumismo, deturpa-se uma luta histórica que ainda hoje não foi plenamente vencida.

A liberdade, assim como o poema que repousa à base do monumento original, não é uma mercadoria. Ela é uma aspiração, um direito fundamental que transcende qualquer interesse econômico. Usar um símbolo tão carregado de esperança para adornar fachadas comerciais é não apenas uma apropriação, mas um desrespeito ao seu significado mais puro e necessário.

O apelo que ecoa do passado nos lembra: liberdade não é comprar. Liberdade é respirar. É acolher. É construir um mundo onde todos, independente de seu cansaço ou pobreza, possam encontrar uma porta aberta e uma lâmpada erguida, indicando o caminho para uma vida mais justa.

Palmarí H. de Lucena

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