Falo não apenas como observador de Igreja, mas como alguém que viveu por dentro seus braços estendidos: treze anos dedicados à gestão de programas de ajuda humanitária em nome da fé — entre aldeias da África, conflitos na America Central, vilas esquecidas da America do Sul e comunidades resilientes do Caribe. Ali, compreendi que a missão da Igreja vai além da esmola: é luta. Não basta alimentar os pobres, é preciso também defendê-los.
E é por isso que, ao olhar o cenário de uma sucessão papal iminente, meu coração se volta para Luis Antonio Tagle.
Tagle me parece carregar no rosto e nos gestos aquilo que vi florescer nas periferias do mundo: uma fé que não se encastela. Uma Igreja que não teme sujar os pés de barro nem as mãos de política, quando o objetivo é erguer quem foi deixado no chão.
Vi padres e leigas enfrentarem milícias armadas para proteger comunidades. Vi irmãs carregarem sacos de arroz como cruzes silenciosas. E vi, muitas vezes, o silêncio do Vaticano parecer ensurdecedor. Mas com Tagle, o tom muda. Ele fala dos pobres sem estetizar a pobreza; acolhe sem medo de perder o dogma — porque sabe que doutrina sem compaixão é letra morta.
Como presidente da Cáritas Internacional, não apenas distribuiu ajuda: levou a presença da Igreja a campos de refugiados, zonas de guerra, regiões devastadas. Como prefeito do Dicastério para a Evangelização, traduziu a missão eclesial em movimento: uma Igreja que caminha com os povos, e não sobre eles.
Luis Antonio Tagle é, sim, conservador em muitos pontos. Mas sua alma é progressista no que mais importa: no compromisso inegociável com a dignidade humana. Ele não é apenas um administrador da fé — é alguém que compreende que a fé, se não for vivida em favor do outro, torna-se estéril.
Num tempo em que muitos confundem neutralidade com omissão, Tagle nos lembra que a verdadeira missão da Igreja é tomar partido. E que esse partido deve ser sempre o dos pobres, dos feridos pela história, dos empurrados para fora das cercas do privilégio.
Se me fosse dada a graça de um voto no conclave, eu o entregaria a ele. Não por estratégia, mas por memória: a memória das vozes silenciadas que encontrei ao longo desses treze anos e que clamam por uma Igreja que não apenas console — mas proteja, denuncie, resista.
Tagle, para mim, representa essa esperança.
Palmarí H. de Lucens