A força tarrafa da intervenção

Dificilmente encontraríamos um cidadão brasileiro que não afirmasse sem hesitar a suspeita de que o crime comum floresce nas favelas das grandes cidades, ocupações ilegais e populações vitimadas por exclusão social. Pessoas vivendo em comunidades pobres constituem a maioria das vítimas de crimes violentos e aqueles caracterizados de crimes não-violentos ou de colarinho branco como práticas corruptas e desvio de recursos do Erário por agentes públicos, lobistas e empresários.

A lógica de operações deflagradas pelas Forças Armadas no Rio de Janeiro pressupõe a presença difusa de criminosos nas comunidades afetadas pela intervenção. As autoridades parecem optar por varreduras, ou seja, jogar uma tarrafa para “pescar” provas em casas de comunidades pobres ao invés de colher inteligência e individualizar os pedidos de busca e apreensão. Procedimento que não é usado em residências e prédios luxuosos, contrariando o princípio de que “ dinheiro ilícito se lava no asfalto”.

Entre as pautas prioritárias do povo brasileiro estão corrupção e segurança pública. A crise de segurança do Rio de Janeiro ofereceu uma saída para o atoleiro legislativo confrontando o Poder Executivo. Denúncias contra o Presidente e seus auxiliares mais próximos tornou impossível realçar o combate à corrupção. O inferno carioca transformou-se em um paraíso político para os pecadores suspeitos de cometer sérios desvios éticos e se beneficiar dos resultados de práticas corruptas.

A militarização da segurança pública no Rio de Janeiro ignora o fato de que os problemas de segurança no país são multicausais, requerendo também investimentos e intervenções nas áreas de saúde, educação e habitação. A criação da pasta de segurança pública no contexto da esperada não aprovação da reforma da previdência e o fato que estamos em um período pré-eleitoral reiteram a suspeita de que a lógica da intervenção se aproxima muito mais a considerações de ordem político-partidária do que da retórica neo-Bolsonariana do constitucionalista Michel Temer e dos seus acólitos no Planalto.

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores