A fé e as montanhas da Capadócia

Entramos em um anfiteatro natural, um vale cercado de formações rochosas bizarras, chamado o Museu ao Ar Livre de Goreme, na Capadócia. Paisagem surpreendentemente estranha, criada pelos caprichos da natureza, há milhões de anos. Erupções vulcânicas haviam depositado na superfície uma espessa camada de lava macia, conhecida como ¨tufa¨. O vento, a chuva e os rios erodiram a tufa ao correr dos tempos, criando vales flanqueados por penhascos escarpados de uma sinuosidade agradável aos olhos e às pernas cansadas.

Formações apelidadas de ¨chaminés das fadas¨, cones de tufa e cinza vulcânica com seus topos precariamente cobertos por lajes de basalto, possivelmente as criações mais atraentes e espetaculares da região. Rochas de diversos tipos e qualidade completam o cenário, adicionando verdes, azuis e ocres à paisagem árida e desolada, criando ondas bruxuleantes que mudam de cor dependendo do ângulo do sol e da estação do ano.

Misteriosas cavernas nas escarpas abrigam marcas milenares da presença humana. Cidades subterrâneas com mais de dez andares de profundidade abrigavam comunidades primitivas. Quebraram e modelaram rochas para satisfazer suas inclinações artísticas, necessidades do dia a dia ou para criar instrumentos para a caça e a guerra.

Escondido nos ventres das escarpas, igrejas e mosteiros construídos por cristãos e monges entre o sétimo e o décimo terceiro séculos, oferecem uma crônica visual da arte e da arquitetura religiosa bizantina. Os períodos ou estilos podem variar, mas os lugares de oração e retiro que construíram são testemunhas milenares do poder incontestável da fé, que transformou as entranhas das montanhas da Capadócia em santuários e lugares de oração que nos levaram a uma reflexão profunda sobre a humanidade. Sobrevivemos a séculos de opressão e hoje, com todos os direitos de liberdade de culto e crença nos nossos países, ignoramos a situação oprimente que ameaça a sobrevivência das comunidades cristãs do Oriente Médio e nos países islâmicos intolerantes à diversidade religiosa. Eles não têm mais cavernas para escondê-los.

Palmarí H. de Lucena é membro da União Brasileira de Escritores