A ausência de líderes com autoridade moral é o que mais mina uma democracia vibrante e comunidades saudáveis. Quando líderes formais atuam sem moralidade, eles enfraquecem as fundações que sustentam nossas instituições. Sem líderes que, através de seu exemplo e decisões, protejam, celebrem, afirmem e reforcem nossas normas, as palavras registradas em documentos fundamentais, como a Constituição Cidadã, jamais conseguirão nos unir verdadeiramente.
Nossa sociedade perdeu muitos de seus manguezais sociais, normativos e políticos — todos aqueles mecanismos que costumavam filtrar comportamentos tóxicos, amortecer o extremismo político, nutrir comunidades saudáveis e instituições confiáveis para o desenvolvimento dos jovens, e que mantinham nossa sociedade coesa. Porém, no tipo de mundo sem normas em que vivemos, onde normas sociais, institucionais e de liderança estão sendo corroídas, ninguém precisa se sentir envergonhado porque nenhuma norma foi violada. A presença de pessoas em posições altas fazendo coisas vergonhosas dificilmente é novidade na política e nos negócios.
A responsabilidade, especialmente entre aqueles que prestaram juramentos de posse — outro manguezal vital — também sofreu destruição séria. Seu senso de responsabilidade para parecer acima da política partidária e para manter a integridade das decisões não permitiria isso. O Congresso brasileiro, por exemplo, é uma instituição que frequentemente quebra a própria palavra. Infelizmente, os partidos políticos são os maiores promotores da impunidade e da legislação em causa própria. Não há qualquer segurança jurídica quando se trata de partidos e legislação eleitoral.
Dov Seidman, autor, colunista e empresário americano, fundador de uma empresa de gerenciamento de ética e conformidade, observou que “as pessoas em toda parte parecem estar moralmente despertas” e que isso é “geralmente uma coisa boa” ao enfrentar questões como racismo ou policiamento abusivo. No entanto, quando o despertar moral se manifesta como indignação moral — e exigências imediatas de demissões — pode resultar em um ciclo vicioso de indignação moral atendida com igual indignação, em vez de um ciclo virtuoso de diálogo e o árduo trabalho de forjar um entendimento real.
Agora, as vozes mais partidárias vão diretamente das redes sociais para o Brasil das pequenas cidades, sem a mediação do impulso de um jornal ou estação de rádio local que mantenha uma comunidade onde as pessoas sentem algum grau de conexão e respeito mútuo. Como na natureza, isso deixa o ecossistema local com menos interdependências saudáveis, tornando-o mais vulnerável a espécies invasoras e doenças — ou, na sociedade, ideias doentias. O discurso civil e o engajamento com aqueles com quem você discorda — em vez de imediatamente pedir que eles sejam demitidos — também costumavam ser manguezais.
Infelizmente, passamos de uma época em que não se deveria dizer “pô” no rádio ou TV para uma nação que agora está permanentemente exposta a sistemas lucrativos de manipulação política e psicológica. As pessoas não estão apenas divididas, mas sendo divididas. Mais do que nunca, estamos vivendo na “tempestade sem fim” que Seidman descreveu em 2016, na qual distinções morais, contexto e perspectiva — todas as coisas que permitem às pessoas e aos políticos fazer bons julgamentos — são varridas. Varridas é exatamente o que acontece com as plantas, animais e pessoas em um ecossistema que perde seus manguezais.
Palmarí H. de Lucena, 07 de julho de 2024