2019: o ano dos protestos

Um líder é melhor quando o povo mal sabe que ele existe, conceito atribuído ao filosofo chinês Lao Tzu, o fundador do Taoísmo. O que aconteceria então se um líder nem sequer existisse? Pergunta pertinente a natureza difusa de protestos mundo afora, liderados em sua grande parte por multidões de manifestantes expressando descontentamento e realçados pelo ecletismo de suas reivindicações. Estamos terminando 2019, sem identificar pistas ou acumular ensinamentos sobre o rumo de futuro protestos, diante do perigo presente no crescimento de regimes autoritários.

Embora movimentos populares sucederam em obter mudanças ou mesmo anular decisões governamentais contrarias aos interesses do povo, tais concessões não pacificaram ou mesmo diminuíram a intensidade dos protestos. Manifestações sem lideres aconteceram ao redor do mundo, atraindo centenas, em alguns casos milhões de participantes para as ruas. Apresar de queixas diferentes, os protestos têm uma característica em comum, utilizam mídias sociais para galvanizar manifestações não-violentas e espontâneas contra seus respectivos governos, desde mudanças na estrutura político-administrativa do Estado ate a renúncia de governantes.

Manifestações de 2019 são remanescentes daquelas que aconteceram durante quase uma década, nenhuma delas direcionadas a categorias específicas exceto a cidadãos que se sentiam defraudados pela classe política. Estruturas não burocráticas permitiram organizar movimentos livres de lideranças hierárquicas, operando horizontalmente sem expor-se a manipulação político-partidária, repressão ou subversão governamental. Seus eventos não resolvem os problemas por elas denunciados, o objetivo principal é trazer à tona questões ausentes da agenda política, demonstrando pacificamente a frustraçãodo povo com a desigualdade e a inerente falta de representatividade. Tratar protestos como surtos ideológicos ou indícios de teorias de conspiração, subestima a eloquência da voz do povo e demoniza a experiência democrática que todos nós almejamos viver.

Palmarí H. de Lucena, membro da União Brasileira de Escritores